terça-feira, 29 de abril de 2014

INVEJO

 

"Quanto mais nos elevamos, menores parecemos aos olhos daqueles que não sabem voar." 
(Nietzsche) 


invejo todos que vejo:
os que têm liberdade sincera,
os que bebem enquanto trabalho,
os que dormem enquanto desamo...
invejo os que desarmam seus pudores,
os que perdoam sem lembrar,
os que esquecem e sonham,

invejo os que versam paixões,
os que querem e conseguem,
invejo os mais belos, os mais inteligentes, os que cantam...

invejo os plenos,
invejo os que planejam, os que planam...
invejo os jovens que acreditam,
invejo os carpe diem juvenis, a imprudência

invejo o sereno olhar do senil,
a confusão do esclerosado,
a confirmação do esclarecido,
invejo os insones que curtem o nascer do sol,
invejo a preguiça dos enguiços,

invejo a lábia do vendedor, 
invejo os lábios que beijam com fervor, 
os sábios de quiz, 
os que sabem ser feliz, 
e os que, por um triz, sabem ser paradoxos tristes... 

invejo os que saem,
os que viajam,
os que tem um Fusca,
os que tem mil histórias numa velha mochila,
os que trilham, os que movem...

invejo a disposição que não tenho,
o encanto que perdi,
invejo a vida multicolorida dos olhares esperançosos,
invejo os espaços que não alcanço
e a luz que não enxergo mais...

invejo, enfim, aqueles
que não sabem do fim,
os que continuam seus afins,
invejo os que não invejam,
invejo os que apenas são... 

quarta-feira, 9 de abril de 2014

FOTOGRAFIA VELADA


Para Atalija Holanda

verde que te quero Verdi,
ver-te que inverte vestes,
orgasmo em organismos, chuva...
deixai os pingos penetrar, adentrar
e adestrar tua felicidade...
tua felicidade destra,
tua densidade reta,
arestas a bordo de suas bordas,
como barquinhos de papel, barquinho bossa...

girar num sol Van Gogh,
girassóis nublados, inflados
de lados e lábios...
numa fotografia velada,
sagrada, nudez vestida,
revestida de segredos,
de mistérios, estéreos estereótipos:
o comum é vão, o normal desnutre,
do diferencial o trono, da insensatez a paz,
e assim ser capaz
de desfazer minhas paralisias;

como uma sensação vivaz,
audaz e atroz,
nós que nos tornamos nós,
uma corda, um acorda,
acordo, cor do marulho,
um barulho, um atalho,
um caminho num carinho nada subordinado,
aquele recado que preciso, cirúrgico,
no teu mover água, telúrico

no gosto lírico de ser, ser gostoso que és...