segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

ISTO NÃO É UM POEMA

Levemente inspirado no famoso quadro de Magritte...

Isto não é um poema.

Um verso sem rima,
um verso sem rima,
um verso sem verso,
verso sem um,
sem um,
cem, um verso e rima
sem verso, cem rimas.

Nego o que vejo.
Seria negro o que vejo?
(Cegueira)
Será realmente real o que vejo?
O que vejo?
(Cegueira ?)

Poderia até negar um cachimbo.

Mas nego o poema.
O poema ou sua representação?
Sombras?
Sombras do poema?

Isto não é um poema.
Também não é peixe, uma vaca,
um suor, uma defecação...
Isto não é o nada.
Isto não é o isto.
Isto não é o não.

O que é isto, então?

Uma dúvida, uma certeza:
Isto não é um poema.

(2004)

UM

para o riff genial de Jimmy Page em I can quit you baby


Os relógios
marcam um tempo
que renego.
E minhas pernas são ponteiros
e um eixo
do pêndulo universal.

Ecos são falsos
(são apenas ar imitando algumas vozes...)
Ecos são falsos,
as expectativas, inúteis.

O futuro é o maior charlatanismo que pregamos.

Tudo o pretendo agora:
tendo,
pretérito.

(2004)

A LÁGRIMA E O MESMO GOSTO DE SAL

Como um claro brinde do sol,
enxergamos cores ofertadas
e podemos perceber
o quanto somos
em ver (e viver) ilusões...
Serei rei de meu castelo ?
Os peões estão postos.

A lágrima e o mesmo gosto de sal,
o mesmo sabor de suor
e o mesmo
e insano aroma de vencer:
Lições a priori,
chagas expostas por vermes...
O amanhã lhe promete várias manhãs,
mas o que você fez por você hoje?

Se destrua !
Somos serpentes que se auto-devoram.
Mate os eus que te incomodam
e se destrua !
Reconstrua sua destruição
mas nunca, nunca mesmo,
se esqueça dos bons amigos !

O motivo embriagador da vida,
cada passo e cada bactéria
(como parar os tic-tacs do relógio?
como não arrancar folhas do calendário?
renegar a história?
abafar, eternizar os fatos?
Ser Deus é muito chato...
Afinal, Deus não têm surpresas !!!)

A pauta, a pausa
a palma da mão, a queda
o voo: tudo, arma,
fonte, ponte, forte
fortaleza imóvel, fixo
- Devo aprender a vencer
devo vencer e aprender
aprender, devo (dever) vencer.

(2004)

SEVERAS

Severas são
as palavras que azedam,
que nem limão,
num corpo virgem e mudo.
Severas fosse
a enxada
que fere,
a enxada
que cava
a enxada e sua dura milícia.

Severas lágrimas
que caem do rosto por fazer,
Severas
destila
severas...

Severas a pluralidade
de servir.
Severas
verás um sol
confundir-se
com o próprio Demônio !

Severas
não severas,
Código
pródigo,
um prólogo
final.
Severas,
Severas,
Severas.

(2004)

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

NÚMERO PERFEITO

encontrei meu número perfeito,
aquele do qual faço par,
pessoa ímpar que mudou minhas coordenadas,
que coordena meus instantes.
me faz refém de seus olhos,
do vê-la e revelar-me...

você assim:
do nada fez-se meu tudo,
do insólito momento tornou-se luz,
eu ainda em queda, você foi rede,
fonte que mata a sede,
sedento e ungüento este desejo de amar...

só você pra transformar o insosso dia
numa noite mágica,
só você pra não me ver
e me ver, tão verme,
tão máximo...

meu número perfeito,
minha cabala, meu caber preciso
meu cabide, meu beber...
lhe encontrar foi temerosamente fantástico;
orgânico, nada plástico:
natural, calmo, feliz...

meu logaritmo benigno,
meu magno ritmo,
minha cadência mais bela,
cor mais vibrante de todas as aquarelas,
Matemática única que curto:
somar você em mim, diminuir meus males
multiplicá-la sempre em meu coração
e dividir contigo tudo que há de bom em mim...

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

NOSSO SÉTIMO DIA

Para Zayra, meu amorzinho bom...

Todo amor passa pelo sétimo dia
nosso sétimo dia, dia santo...
no sétimo dia, descansar
o sétimo dia, se cansar
sétimo dia, descascar, descarar...
Envolver-se no tal casco
Abnegar-se dos ascos
e se entregar totalmente ao acaso....

gosto quando você me nota
gosto quando você me desnota
gosto quando você me desnorteia
gosto quando você nem nota,
quando olha pra todos,
pro nada, pro vazio de tudo...
gosto quando você me olha,
gosto quando você me faz seguro
Gosto do seu gosto, dos seus lábios puros,
da sua boca que me chama,
da chama que incendeia nossos olhos
quando um está a olhar o outro...

prendo-me em suas mãos
e vou...
entrego-me então aos perigos,
escondo-me nos abrigos
de seus braços sutis,
condiciono-me feliz,
esforço-me para ser o perfeito
quero fazer direito:
você é a direção.

sou seu devoto
sou seu, de voto e de dever,
quero sempre ser seu prazer
da mesma maneira que você me retribui,

quero amar, se amarrar no seu cadarço
ir ao seu endereço, me adequar aos seus espaços
passar momentos contigo,
passear por seu umbigo
minha prendada, prenda minha
meu presente, meu brinde
meu brindar, meu brincar...

nunca vou lhe deixar
por que não seria justo comigo também...
minha dependência, meu vício
meu ócio, meu cio
aquilo que nunca deixa nada vazio
quem quero, espero
e saberei esperar sempre.