sábado, 28 de junho de 2008

A POESIA DO PEDREIRO E DA DAMA

Não penso na poesia rica,
assim tão rica,
rimada aos extremos,
um Castro Alves talvez...

Penso na poesia viva,
vida,
a poesia passo,
a poesia do pedreiro e da dama,
a poesia que soa como minhas sinceras verdades,
a poesia intimista...

A poesia como parte minha,
assim como o baço ou o braço,
o ócio e o ofício
dependem das minhas mãos:
labuto e descanso na sombra da ignorância,
não ouço música clássica
- a guitarra é um pouco de mim -
sou tanto populista,
referencio os repentes, de repente...

Não penso na poesia como solução
ou página de "Minutos da Sabedoria",
a poesia diz sem dizer,
a poesia nunca foi e nem será fábula.

Poesia amoral,
poesia tão poros, tão nesga de nada,
a poesia que ensina a viver sem levá-la muito a sério.
A poesia nunca academicista - poesia racista,
que restringe tudo e todos -
a poesia minha, tua, da rua ou da encruzilhada,
a poesia sem sensualismo, contudo erótica
- pois sou erótico -
a poesia masturbatória, poesia coital
e tal como a vida,
a poesia lírica e tosca,
um violino tocando minuetos vadios,
a poesia sem críticas e pingos nos is.

A poesia, enfim, poiésis
Poesia criada e nunca censurada,
a poesia sem poetas,
a poesia sem poesias...

(2006)

OS EXTREMOS

O mar dando aconchego,
a visão azul do mar ofertando este lirismo de vê-lo,
eu e você:
a combinação cósmica, um véu de estrelas.

Vivendo os extremos da força,
buscando a lúdica adulta de sermos fracos,
quem sabe a sábia dama estará pedindo carona,
seria meu amor ?
seria o amor ?
Uma breve ilusão:
A violeta e violenta vida.

Somos a busca da simbiose
dinheiro ou sexo, não importa a ordem;
movemo-nos por isto
quiça por ambos ao mesmo tempo...

O amor é cifrão e um bocado de gozo !

Entretanto entendo o mar e sua doação,
vejo-o, analisa-o, tento absorvê-lo até o fim de meus pulmões.

Esqueço.

O mundo então é a lembrança, o que não quero lembrar,
o mundo é a bifurcação do que sou e do lamento em querer ser o que não sou,

E quando não entendo estes sofismas,
deito minhas costas na areia
e deixo o mar entrar em mim.

(2006)

UMA CURTA

Eu
na sua,
só na sua...
Eu só e na sua:
como pode ser ?

(2006)

DIZIA MARIANA

Dizia Mariana, numa conversa tão nossa,
que a vida não é o samba que canto,
que os outros não são o que são,
que a mudança só viria se eu a quisesse,
recomendando-me, antes do amanhecer,
que o amar pode ser o primo maior,
que o amor está longe, nunca tão distante prum olhar.

Assim dizia Mariana...

Então quis abraçar o vento,
molhar de suor seus cabelos,
fincar flores no brotar de seu chão,
esculpir estrelas em malandrice...

Fantasia demais nunca é demais !

Mas Mariana dizia que a realidade não era apenas um casamento,
e que o vôo pode ser mais alto,
recomendou-me voltar
(dar tantas voltas pra quê ?),
duas crianças sentadas numa pedra:
um futuro e dois corações.

(2007)

O DUB

De grão em grão
a galinha enche o papo
de papoula,
de ampola,
a moqueca do macaco velho,
a moleca e um caco de vidro.

A última morte.
O último monte,
o último morro: esperanças...
Ainda escalo
mil calos,mil calar,
Ser uma resposta posta,
postal da estrela e da trela
mesa posta,
meio poste
um meio pra se chegar.

Tudo dúbio,
o dub,
viciante som,
variante tom
o mesmo esmo
esmola, maresia.
Um mar, um azul qualquer
querendo rasgar a pobre retina,
o mar, que gigante me absorve
sorvendo
servindo
vendo e vindo
sermões
sorvete

bola de bilhar

bilhões e bilhões
de partículas
engolindo
atmosferas,
atómo
esferas
sol, mundo, galáxias
muitos, muitos pontinhos
uma vida
uma vinda
convida
o breve choro do cavaquinho.

(2007)

FIM DE AMOR

Meu bem
a flor murchou
logo depois
que o amor acabou:
a conclusão que outra mão
colheu de sua pétala.
E daí imaculada
a sua imagem já cravada
neste coração maldito, tolo, coisa acéfala...

Neste fim de amor
conclusão deveras demais:
fui tarde
e aqui então jaz
assim, sem alarde
um sol de minha vida
saída de meus labirintos concretos,
incertos momentos de meu lar.
Fiquei na fossa
sem esta coisa nossa
que nem a dois acabou por se tornar.

Agora é viver sem esperanças,
tanta ânsia para ter alguém.
E, descubro, nestas andanças
que encarar a flor já padecida
não é pra qualquer um, meu bem !
se esta ilusão antes tão oferecida
agora é amalgama sofrida,
agora é realidade por encarar...

(2007)

segunda-feira, 23 de junho de 2008

ASSASINATO EM CIDADE GRANDE

Uma família tradicional de uma grande cidade grande, contudo tradicional. O pai, apressado em seu café, ainda encontra tempo para ler uma manchete de um grande jornal em circulação:
“Amor, veja esta...”, ele diz, pondo na boca um pequeno pedaço de torrada, “Crime assusta favela da cidade: homem, enfurecido de ciúmes, mata e trucida namorada !”
A esposa, no preparar das panquecas, pareceu dar mais atenção ao filho que reclamava do seu atraso para ir à faculdade.
“O que você disse, Romualdo ?!”, pergunta.
“Ouve-me, Felícia ! Tá aqui no jornal: um homem matou a namorada e trucidou ela todinha...”
“Cristo-Deus ! Deixa eu ver...”
Agora é o filho que reclama do desleixo.
“Espera um pouco, Dadinho ! Deixa eu ler isto aqui do jornal... Meu Deus ! O mundo tá acabando mesmo...”, a mãe quer tomar o jornal do marido.
“Peraí, Felícia ! Deixa eu ler meu jornalzinho em paz ! Filho, me passe a manteiga !”
O rapaz passa o pote e exige da mãe uns ovos estrelados.
“Sabe que eu nem mais me espanto com estas notícias ?! Primeiro que na favela sempre acontece estas coisas e depois que no mundo inteiro se matam pessoas...”
A mãe, da frigideira, comenta:
“Pois é, Romualdo.Mas eu fico com medo, sabe ?! Eu só penso nas discussões que os nossos vizinhos têm...”
“Tu é besta mesmo, Felícia ! Aqui é área nobre, estas coisas não acontecem em bairros como o nosso ! Dadinho, hoje você pega ônibus. Tô atrasadíssimo...”
Assim o pai sai, deixando o jornal de lado. A esposa o apanha e ainda relê a notícia do assassinato. Suspira um cruz-credo, dobra o jornal e guarda-o como os mais velhos. O senhor da reciclagem passa as nove.

(2006)

ASSASSINATO EM CIDADE PEQUENA

Uma cidade pequena, minúscula e encravada num estado tão medíocre quanto à insignificância do país em que dele federava. Um local pacato, com a pracinha exalando a infâncias nascidas e velhinhos jogando dominó como passagem dos dias. Havia o coreto e a igreja tombada pelo patrimônio público. A dona de casa ainda varria suas calçadas no primeiro raiar e a fumacinha negra que surgia nos altos dos telhados era o indicio das despedidas. Tinha, talvez, umas poucas centenas de casa, com média de quatro ou cinco habitantes. Do pároco ao mendigo, todos eram cúmplices. Pois foi com espanto que a cidade acordou no dia do tal assassinato.
Fora o açougueiro que havia dado mais de cinqüenta facadas em sua esposa, jovem cabocla muito querida nas cercanias. Motivo aparente: ciúmes. Na casa do casal, poças de sangues e pedaços do corpo espalhado pelos cômodos. A cabeça da esquartejada estava em cima da penteadeira, bem a frente do assassino, que a observa num tom catatônico e plácido. Seu avental de ofício estava de um rubro brilhante. O delegado da cidade, que o muito que fazia diariamente era várias sestas na sua confortante cadeira giratória, antecipou-se muito rapidamente: decretou prisão no ato !
Dias e dias de comentários. Todos, das senhoras do crochê na porta até os alunos da escola estadual. Não tinham outro assunto, discutiam sempre as novidades do caso: um possível canibalismo do açougueiro ?! A traição havia sido com o Menelau da quitanda, sumido desde o dia do acontecido ?! E as sucessivas mortes desde então: o da centenária Tia Chica, o do já desenganado Seu Alcides, o coração da viúva Santinha que parara duma hora para outra ?! Pela primeira vez a pequena cidade teve medo. Queriam o linchamento do açougueiro. A mãe da cabocla era um chororó que só vendo... Todos os dias eram visitas e o exame médico do doutor Jacks. O irmão da falecida jurava vingança. E o crime chamara a atenção do jornal de uma cidade vizinha, bem maior que aquela sofrida pela barbaridade do acontecido.
Pois surpresa foi quando o açougueiro declarou-se inocente, apesar das evidências testemunharem o contrário. Dizia amar a jovem cabocla e aquilo jamais o faria. Então o alvo das suspeitas agora se destinou ao empregado da quitanda. Havia bolões, apostas para se descobrir o verdadeiro assassino. A maioria desconfiava do açougueiro. Menelau era cria da cidade, todos o conheciam desde moleque, tinha boa índole e era bem quisto pela cidade toda.
Então se chamou um detetive da capital. Investigou-se, apuraram-se os detalhes, omitiu opiniões e conclusões, tudo foi feito num clima nunca visto na localidade. O detetive acabou se tornando uma figura comum por lá, ao ponto de ganhar diários pães com ovo e um engraxate particular. Tudo gratuito, apenas com a simples obrigação de desvendar o mistério do crime. Demorou meses, pouco ainda se comentava sobre o crime. Até que o laudo do policial catedrático emancipou-se: o culpado era o açougueiro, o próprio declarara após uma sova daquelas.
O açougueiro foi preso, mas mediante um advogado acabou sendo solto com pouco tempo de xilindró. Mudou de cidade e soube-se que acabou por se matar anos depois. Motivo ?! Ciúmes por causa de uma outra cabocla.

(2006)

sexta-feira, 20 de junho de 2008

RESPOSTA A DEUS

E Deus criou o homem...
E o homem criou deuses.
Então o homem criou o pecado -
G(g)raças a Deus !!!!

domingo, 15 de junho de 2008

LINDAMENTE

para minha cumadre Geane

Lindamente me aparece ela
tão doce, lúdica, singela
ou apenas uma sereia..
Um deusa da mata,
coisa que arrebata
numa batida de violão...
numa partida de avião...

Lindamente, solenemente
soberana, rainha do lugar santo
e que para meu espanto
ainda é amada,
ama da vida, cumadre, amiga, amiga...
Lindamente,
desta natureza embebe
este ser hipnótico,
e diante todos os diagnósticos,
um brilho sem igual...
Tranquilamente,
uma ode de aêdos magnos,
esposa do amar,
posa no meu pousar,
musa do artista,
a primeira vista...
ao primeiro olhar...
Lindamente,
linda, linda, vem do vento
a flor desprendida do seu lar,
um desejo bom,
doçura do bombom,
um pedido, este meu poemar..

ESTA EMBRIAGUEZ

Não sei porque desta minha embriaguez desmedida;
esta embriaguez insólita, insossa, sem precisão...
Talvez seja porque a vi,
porque pensei ser tão raro vê-la,
talvez porque me enganei...

Decepção é ferida mordaz...
traz em meu peito guerras, nunca a paz.
E assim me transformo, me desformo, viro fera
e aí o febril da quimera,
augustiniana pantera,
xingo a todos e me auto-flagelo...

Esta embriaguez é por alguma coisa incisa
meu desejo que se multila,
novamente rimar não se precisa
este me revelar pareceria tão óbvio...
remexo minha dor
e a transformo em poesia.
Mas ainda sim inaudita...
e assim fica no breu, não está viva.
A embriaguez que torna-me, dia a dia
menos homem
mais animal
mais ou menos uma busca
de um dia ainda vê-la estátua.

E assim ser feliz sem você estar aqui...

quinta-feira, 12 de junho de 2008

PATY

Paty, um sorriso
Paty, um acalanto
Paty, encanto
Paty, canto por voar...

Paty, um sonho querendo dormir
Paty, parte de um desejo
Paty, amiga de longe
Paty, alegria aos montes
Paty, um agradável sândalo a aspirar

Paty, uma menina
Paty que domina
tudo mais que ilumina,
Doçura meiga, cálida mulher.
Paty, criança que acha um ninho de bem-te-vi
Bem-vinda, bendita, beleza marmórea,
A meiguice infantil de uma descoberta boa,
Caçar caracol, enamorar de sol, nado na lagoa...
Paty, crisálida em seu abrigo frio
Paty, adocicar-me no assobio
A música de uma vida toda a te clamar....


Paty, simplesmente
A amiga que me surpreende
Com recadinhos lindos no orkut a me alegrar...

(2007)

TEXTO CABOCLO

Ser tão homem, tão demasiado humano, tão húmus, tão ser... Ser tão chão, tão cão, a vida insípida, a carne frágil e a alma forte, do corte facão, reluzente lâmina, couro, juá, umburana, angico, gameleira, barriguda, aroeira... Do espinho do xiquexique, da semente do licuri, do embrião em que se nasce e embriaga, sumo da jurema... Da carcaça carcará, assobio sem fim da caetana que adentra o coração, ronco do trovão, da barriga por comer... Chuva de estrela como num reisado mítico, chuva que deveras falta, noite-lua em faísca sem igual. Ser tão Severino, Maria, Sinhá Vitória, menino Jesus, ser tão sertanejo, da raiz e da enxada, do pião ou canção de lavadeira... No tear que teça o destino, o tino, o hino no louvor das ladainhas, no som mudo da sua miudeza, a força da esperança, olhos negros pro céu sem nuvens, nem sonhos, mas cheio de invocações. Ser tão umbuzeiro, ser tão macaxeira, ser tão quixabeira, ser tão parte de uma arte chamada vida, na sua chamada lânguida, em coro, num coral, oráculo, orar... Ser tão sertão.
Apresento-me caboclo, amorenado, neguinho, sarará, galeguinho do olho azul, Hércules-Quasímodo, herói errante na sua busca pelo que viver, pelo que lutar. No canto da patativa, no encanto do Patativa: “Sertão, arguém te cantô/ Eu sempre tenho cantando/ E ainda cantando tô (...) E vejo qui os teus mistero/ Ninguém sabe decifrá./ A tua beleza é tanta,/ qui o poeta canta, canta/ E inda fica o qui cantá...”. Sertão hibrido, cheio de seus mistérios, uma fogueira que arde no céu – rei sol que adentra nosso corpo vil, dorso forte, barba por fazer... Apresento-me cicerone de sua guarda, mostro-me às carniças que devoram monstros, sou pálido, esquálido, mas ainda tenho braço e gana. Busco este sertão adormecido no meu ente, o núcleo-duro do ventre do âmago, coisa minha que me faz tão regionalista, tão areia, tão pó, tão sertão... E manifesto este ego labiríntico na expressão de meus punhos que empurram meus instantes, meus cotidianos, histórias de minha avó. Sou arte brasileira que exaspera desconhecida, sou o limbo escondido que desvela no voto pro coronel, sou aquele olho que incha d’água, o pé solado da lama incandescente e inexistente, sou a paz da cotovia que anuncia mais uma chuva, mais um oráculo, mais uma centelha chamada esperança... No caminho vermelho em que piso, restará a lágrima que sustentará meu amanhã...

(2007)

UM VINTÈM FURADO

Ao som de “Um pouco que sobrou” ( Los Hermanos )

No bolso tenho felicidades
e um vintém furado,
A vida é tão grande :
eu, tão minúsculo,
tão pequeno para administrá-la...
O mundo é enorme,
sou tão ínfimo, para quê futurá-lo ?!

Ainda não sei o que fazer com meus braços atados,
não sei como agir se minhas mãos estiverem soltas,
imagino que todos me cobraram
o emprego que não tenho,
a moça que me despreza,
os anos que devo respeitar...

Vivendo a deriva deste barco
navegando em mares nunca dantes navegáveis,
acredito nas pessoas do Pessoa.
Compreendo o mágico do bem vivenciar
e entendo a doçura tênue daquilo que virá,
terei que me adaptar ao doce senso de meus fatalismos.

(2006)

terça-feira, 3 de junho de 2008

ODE ONDE

ode
onde
aonde
tudo
ao
menos
meus pêlos,
meus apelos,
nada
ainda...

Ode
onde
a onda
quebra-se
branda-se
buscando
andar
seguir
ou ir
ouvir...

ode
pode
vá !
Vamos
pois podemos
até onde ?
Não saberemos...
Mas iremos,
talvez serenos,
ou nesta tal vez, intensos
na tensão
de sabermos que somos
ora tomos,
ora sãos.