sexta-feira, 26 de setembro de 2008

(N)OSSOS

Amar:
rama flutuante,
um Romeu amante, em êxtase
amar...

Amar:
o que não sei;
íntimo desconhecido,
o que dói.
anti-herói
partícula que destrói
parte mácula,
a pureza,
amar...

minha namorada imaginária
solitária
solidária,
minha amada ordinária
tão casta e tão fútil
amá-la, tão inútil
e assim, despindo-me sutil
minha amiga imaginária
amiga sem som, sem presença
nossos
ossos...

amar
o que não entendo
ainda amar
o que não entendo
e continuo pretendendo
aquilo que não toco
algo oco
sem coração
sem vida...

amar, como se pra buscar saídas
amar e emaranhar-se neste labirinto,
amar entrelaçando-se
criando teias, abrindo atalhos
amar na certeza duma enxaqueca,
no quebra-cabeça de montar e desmontar-se
amar em seu trono
não sendo apenas dono, mas sim domador.
Amar e ser escravo, somente isto
Amar enquanto enguiço
Amar e ter a sorte disto,

Amar e tão somente, mar...

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

SEU REBENTO

para uma amiga bem especial, num momento bastante especial...

Do seu ventre de Vênus,
do seu ente que virá,
deste embalar e ninar:
seu rebento...

Que não é meu, que não é meu,
mas é meu também,
e de todos os amigos:
herdará o sangue de todos que te querem bem;
é o bem que te querem,
o já bem-querer:
seu rebento...

que será bento...
que terá saúde...
será meu amigo...
terá mil futuros e os cantará comigo...
será filho de minha deusa...
terá dela toda sua beleza e ternura...
será abençoado
terá todas as benções,
um querubim ainda em grão,
o maior de todos os gigantes:
seu rebento...

arrebatará nossos corações com o seu pequeno coração a pulsar,
tornará luz de nosso guio,
será filho, uma criança, vida...
uma lágrima no senso da alegria,
bonito instante a brotar
em cada passinho
em cada carinho
no carrinho ou na boneca,
no desenho pintado a dedo e entregue a mamãe,
sapatinho de crochê
papinhas e cocôs...

simplesmente seu rebento
consciente estou a todo momento,
uma agonia boa – acredite – pousa em mim...
assim tento lidar minha vida,
sabendo que mais uma vida
vai distanciar-me de você,
seu rebento...
sua outra vida...
matei algo que havia
e o refiz diferente – maior talvez ?
Não saberei....

domingo, 14 de setembro de 2008

EU LÍRICO

E dentro
do poema indissoluto,
veio a deusa-mãe
e assanhou
com seu afago cósmico,
o universo das fadas e das rimas;
e viverão
plácidos
jovens guerreiros
que não me fazem esquecer,
que a poesia virá e logo
desviará
por torpes caminhos que
me abnega
um amanhã...
E mesmo que eu
não queira dizer
nada, nada não...
o poema é fêmea
e transformará
o botão
numa flor qualquer,
num mal-me-quer
nudez da pétala,
sedução vil...

O poema então será
chaga,
um chega
uma chaga e
uma praga;
prego da cruz cristã.
O poema será a solução
a diluição
e o mundo estará
então
salvo e são,
consigo e contido,
na busca da palavra hieroglífica
da insanidade.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

BEBETA

para Roberta (do São Bento)

O que será que há
No sorrir de Bebeta ?!
Uma borboleta,
A felicidade tão certa ?!
Certeza, Bebeta
suas portas estão sempre abertas,
Fácil é, seguirei as setas:
Lá ela estará
Lá encontrarei Bebeta...

E Bebeta é cotovia,
A canção que se ouvia,
A prece que se assovia,
Tudo que se desvia
Da tristeza que lá não havia,
mas que era coisa tão concreta...
Ela então destrói este aço
Vence as barreiras e dá o passo
Pra onde se encaminha a alegria
De ver todos os dias
O alegrar de Bebeta...

Bebeta, coisa linda
Destas que é muito mais ainda
que qualquer adjetivação vinda,
que todas as coisas infindas,
maior que o próprio poema, muito maior que o poeta...
é esta menina que faz a vida brindar, feliz e clemente
de toda a fantasia entorpecente
que há no olhar místico de Bebeta.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

SOL CLARO

O sol claro
é claro;

O sol claro
é raro;

O sol claro
é trato;

O sol claro
é girar, girassol;
é flor
na lapela
de Deus,
O sol claro
é guiar
dos solos terrenos,
O sol claro
é o aro,a aragem
é rara passagem,
um beijo nas nuvens, algo multicor...

O sol claro é
o morrer,
quando se despede do dia, todo os dias
quando solenemente a de poer.

domingo, 7 de setembro de 2008

DESVIOS INSONES

Como um sorriso
terno, infantil
eterno, infante
um passo adiante,
coração que desfila
por desvios insones...
Barco que circunda meu ser
atesta com seu arco,
a flecha cega do alvo...
Coisa que chega e aconchega,
Tão certa
quanto o incerto
momento perto:
o destino, a morte...

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

(P)RIMA RICA, (P)RIMA POBRE

Primeira
rima beira
rima eira
(p)rima rica
(p)rima tão pobre
(in)cabível num poema,
do rai(z)mundo
donde germina
o que não termina
o que irá versar...

rima, imã -
o que dizima
qualquer coisa acima
todas as coisas primas
apenas a poesia terçã...
das intenções dum deus.

E então, o poema
se faz oráculo
o que há demais máculo,
aquilo que doí,
o que assobia...
são estas
(p)rimas ricas
(p)rimas pobres,
tudo deveras sofrem
buscando seu sentido semiótico,
ofuscando su(a)moral...

PAZ, PÃO, TERRA

Para cada operário
ter como sair de casa
ter casa pra sair
e comida na mesa de comer:
revolução
e evolução;
noção da nação - a foice,
o livro, o facão.

(2005)

GARBO

Eu me gabo
do seu jeito Garbo
de ser,
a beleza pura
concreta pintura
expressionista gris.

O seu corpo, pálido
como o tempo
estático,
de metal, plástico,
camurça, grama, papel.
Como o suar das velas,
deslizo nos seus lábios;
eu mordo sua alma.
A dança nos ventos
na fumaça do cigarro,
seu cabelo cai no seu rosto meigo.
Paixão é encontro,
a eterna atração dos braços
e dos traços infiéis,
em seu rosto infeliz.

(2001)

VERSOS, INVERSOS (ABISMO DO POÇO)

O poço esconde
o rosto refletido;
e o tempo vencido,
passa quão vento destemido,
destruindo meu invencível
castelo de cartas.
O segredo na luz do sorriso,
do abraço, do abrigo,
cato cometa no pequeno céu -
o teto sem forro do casebre
e no jardim, a esperança
mora lá, vazia, preenchida da fé.
E alguém me diz
que nada pertence-me mais
do que meus sonhos,
talvez escuto o eco de minha voz
ou há alguém no poço...
Prefiro crer no invisível,
pois até no fictício há realidades
e, enquanto rabisco o chão,
o céu também é rabiscado.
Meus versos, inversos
só o poeta lê o nada,
só o poeta vê pequenos detalhes.
E o poeta é o velho violeiro,
cego na porta de Deus,
vendo-se no abismo do poço.

(2002)

CÓSMICA FORÇA

Cósmica força,
um seio suspenso
donde afloram o aroma,
da unicidade das coisas
ou das tragédias alegres.
Assim é...

- oh, poema !
que vens como cândido
beijo cego,
a anti-inspiração
em ver verdades em sonhos -

Anjos embriagados,
corpos marcados na gota d'água.
Uma flor para se descobrir
o homem, que esconde
dedos que emanam
e rasgam
o véu de Maia...
E assim poderia ser:

- oh, poema !
mitos assasinados
comprimidos para matar...
nossas estrelas inaudíveis
e carentes
um pouco azuis
e longe de passarem duas vezes
na mesma alma -

"Senhores deuses, me protejam
de tanta mágoa
tô pronto pra ir ao teu encontro
mas eu não quero, não vou
não quero..."

- Identifica-se, talvez, a mulher que amo -

Escrevo em carvão
os versos mais sonetos,
apagados
pela mão que afagou,
e hoje esbofeteia.
Assim era.

- oh, poema !
caminho no mar escandinavo,
perdendo-me em desfrutáveis situações,
caindo na merda...
oh, poema !
eu não o contemplo.
Pra quê tempos, se a certeza
é que
tudo
um dia
acabará ?! -

(2003)

P.S: O trecho em destaque é duma música do Cazuza (Azul e Amarelo)

SIAMESES

Quando descobrirem um novo planeta no seu olhar,
verão que seus habitantes são minhas tristezas...

E eu ainda não sei se te amo,
nem sei também de você,
apesar de sermos tão siameses...
Há meses constatei isso,
todos os dias sinto isso...

E é sempre a priori
seus olhos eternamente conterão universos.

(2004)

CARVAVAL DE ARLEQUIM

Palavra-cruzada - quando
nossas bocas se encontram
nossas bocas
desnorteando as línguas, a linguagem,
a saliva alivia
qualquer
sentimento.
Trava-língua - quando
nossas bocas se encontram,
se encontram
em qualquer esquina,
sentindo seu cheiro por telepatia;
nossas bocas
é um carnaval de arlequim,
carnaval...
nossas bocas,
trava-língua.

(2004)

O OLHAR DO SENHOR

É então que percebo... O olhar daquele senhor, só eu e ele estávamos no metrô naquele momento. Tenho mania de conversar sozinha. E era o que fazia no instante em que noto o olhar daquele senhor.
O que pensava ? Será que me achava louca ? Mas não era um olhar punista. Nem era, tampouco, fraternal... Era um olhar niilista. Um vago olhar sem qualidades. Não havia cor em seus olhos. Continuei a falar comigo mesma, insonoramente para os exteriores. E se ele lesse lábios ? Estaria então sabendo de meus segredos ? O nome de meu amor secreto, minhas atitudes inibivéis, os poemas de Elliot que declamo ?...
Comecei a agoniar-me. A cabeça doía, tiro uma aspirina da bolsa e tomo-a. O estranho olhar percebera ? A fisionomia de seu rosto nada denunciara...
A dor não passa, nem a agonia daquele olhar. E o meu maldito ponto não chega. Olho para o relógio, ainda era cedo. Pensei em mudar de lugar. Não conseguia sair de minha cadeira. . E ninguém entrava no metrô, era como se tudo conspirasse para que somente existisse eu e ele.
E eu não parava de conversar com ninguém. Aliás, eu falava com alguém... Ora, ou era comigo ou era com aquele senhor... Ou com todo mundo, explanando ao ar universal minhas palavras... E o incômodo olhar, falava eu à ele ?
Deu-me vontade de gritar, reclamar daquele olhar, denunciá-lo como tarado... Mas os olhos dele oscilavam. Do nada passou a algo, algo que passou a me aliviar, sentia agora a necessidade de ser olhada por aquele senhor. O olhar agora dava-me vida, sentia existência (ou a minah própria existência...), culto, hipnose, respostas, alma... Quis transmitir isso ao senhor. Mas aí ele levanta-se, ajeita o chapéu (desviando, pela primeira vez, o seu olhar de mim...), pede o ponto e desce, sem olhar a mim, saindo completamente de meu campo de visão...
Agora eu era vazia. Estava vazia. Sentia o vazio que aquele olhar me completou. Eu e minha bolsa, a cartela de aspirinas, os poemas que decorei e agora dito-os em voz alta para esse mesmo nada...

(2004 ?)

SEU NOME

Eu só quero saber seu nome...
Pouco me importa como ela vai,
se vem, se passa...
se tem alguém, se seus olhos miram outros,
"se ela dança no sétimo céu" ou se fuma, se sabe, detesta,
empresta ou conjuga verbos no infinito...
Desejo apenas seu nome.
Quero seu nome soando em minha boca,
declamado em meus poemas,
esquecido... inexistente...
absorvido pelo tempo,
eterno terno, seu nome...


Eu só quero saber o seu nome !
Não o sobrenome, a aliança, o CPF ou o partido político...
Diga seu nome, por favor !!!
Cantem-no em auto-falantes,
escrevam no Diário Oficial,
estampem nas camisas rasgadas,
esteja na minha vida...
A rosa tem igual nome de rosa
e todas são iguais...
Todas são iguais ?
Seu nome, talvez comum...
você, sempre
um
ponto
diferente.

(2004 ?)