Na
espera do elevador, ela acabara de chegar. Há um sujeito parado, na mesma
situação...
- E
então ?!
Ela não
atende.
- Você
não vai gritar, enlouquecer, pedir autógrafos? – ele insiste.
A moça
continua sem entender...
- Vai
dizer que você não me conhece?
Ela o
observa como se fosse míope, apertando o olhar...
-
Senhor, confesso que não...
Com certo
descontentamento, ele diz:
- Tem
certeza? Não é possível...
- Mas
por que eu teria que conhecê-lo? Já nos vimos antes? O senhor por acaso é pai
de algum ex-namorado meu? Ai, se for me desculpe...
- Não,
eu nunca te vi na vida... Mas é obrigação sua me reconhecer. Ah, talvez eu deva
cantar um dos meus sucessos...
E
começou a cantarolar algo.
- Ah,
que legal... – ela diz – Então o senhor é cantor ?!
- Como
assim ?! Eu sou “o” cantor!!! Chacrinha me apelidava de “A Voz”...
O nome
do apresento lhe fez concluir que aquele homem devia ser bem velho... Não
comentou nada, apenas escutava:
- Aposto
que você já deve tá lembrada de mim...
-
Sinceramente não... Nunca ouvi esta música. Ela já tocou na rádio?!
- Como “já
tocou na rádio”? Ela foi a música mais executada de 19... ah, não importa!!!
Neste
exato momento o elevador chega.
- O
senhor me dá licença, mas vou descer... – disse, querendo muito se afastar
daquela esdrúxula criatura...
- Eu
também vou descer... – diz, entrando no mesmo recinto.
Ela
tenta esconder o certo descontentamento, mas acabou aceitando aquilo tudo com
um certo bom humor...
- O
senhor se chama...
- Santa
ignorância!!! Eu sou Olano Barbosa...
- Olano
Barbosa?! – franziu a testa, fez biquinho.. – Nunca ouvi falar...
Com ar
dramático, ele diz:
- Como
não?! Não há brasileiro que não conheça ou não tenha escutado Olano Barbosa...
Ela quer
esconder o riso. Então pega o celular e faz uma pesquisa rápida na internet:
- Como é
mesmo seu nome? Orlando Barbosa?!
- Olano –
diz alto, soletrando as sílabas...
- Hum,
certo... peraí... ah, tá aqui no Google: Olano Barbosa...
-
Finalmente... Onde você vai querer o autógrafo?!
- Cara, você
fez sucesso a muito tempo atrás... Não me surpreende seu ostracismo...
A última
palavra lhe é desferida como um tapa:
- Ostracismo,
eu?! De onde tira isto?! Eu continuo famoso!!! Estive no Ratinho semana
passada...
Como que
querendo rever a possível gafe, ela comenta:
- Vou
ligar pra minha mãe. Quem sabe ela não lembra do senhor?!
O
elevador chega ao seu destino. Ambos saem para dar acesso à outros que
esperavam no andar alcançado. Ela com o celular num dos ouvidos:
- É,
mãe: Olano Barbosa... A senhora se lembra dele? Ele tá aqui na minha frente...
Ele sua,
na espera duma resposta...
- Ok,
mãe, ok... Também te amo. Tchau...
E
desliga o aparelho, logo virando-se para ele:
- Cara,
ela se lembrou do nome sim...
O fadado
cantor faz uma pose positiva, erguendo os ombros, sorriso de canto de boca...
- Mas...
– a boca da moça parece dizer aquilo em slow motion, voz de rícino, dilacerante... - ...fazia tempo que ela não ouvia falar do senhor. Ela até
achou que o senhor tivesse morrido!!!
A pose
se desfaz, inaudivelmente ele pergunta:
- Ela ao
menos pediu um autógrafo?!
Apressada
– talvez para evitar algum desembaraço – ela vai, atarefada:
- Me
perdoe, mas tenho pressa... – dá dois beijos na face do “famoso” - ...outro dia
a gente se vê...
E sai
correndo para a portaria. Ele a observa fazer isto, observa o solo e segue sua
sina de subir e descer elevador – aquela era sua rotina diária de alguns anos,
algo de terapêutico, de vital: a busca de um reconhecimento já mofado pelo
insucesso vil...
Um comentário:
Essa história prendeu minha atenção, imagino a necessidade de reconhecimento, para se sentir vivo,feliz, com seu ego sofrido buscando sem sucesso. o sucesso.
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